quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Nota de esclarecimento do CEN sobre as notícias veiculadas no site da Afropress a respeito do Caso da Ialorixá Bernadete Souza de Ilhéus

No dia 23 de outubro fui notificado sobre o ato de agressão de policiais militares contra a Ialorixá Bernardete Souza Ferreira dos Santos através Coordenadora do CEN, Lindinalva de Paula, Equede de Iemanjá e irmã de santo da Iyá Bernadete , seguido do contato de André de Oxum (também irmão de axé da vítima) e Moacir de Obaluayê ,marido de Bernadete e parte envolvida no caso.

Desde o princípio buscamos coletar todas as informações possíveis sobre o caso, com objetivo de dar o melhor encaminhamento ao caso de intolerância religiosa, de violação dos direitos humanos e cidadão, portanto gravíssimo e precisa ser apurado sem corporativismo e dentro do rigor da lei, cuja pena vai de um a três anos de reclusão e multa. Inicialmente levamos o caso à Comissão Especial de Promoção da Igualdade da Assembléia Legislativa do Estado da Bahia (ALBA), que é presidida pelo Deputado Bira Côroa, assim como levamos o caso ao Deputado Estadual Valmir Assunção, uma vez que este tem dupla pertença sobre o caso, na condição de ser uma liderança negra do MST nacional.

Ao longo desse período foram realizadas reuniões diversas, todas com participação do CEN, através dos seus representantes, e a nossa análise desde o início é que seria de fundamental importância formular uma resposta à altura da intolerância praticada por agentes públicos, e conjuntamente com várias organizações do movimento negro e religiões de Matriz Africana alinhamos uma ampla frente, demonstrando atenção e o merecido respeito a este caso.

Dentro das nossas atribuições, enquanto uma organização não governamental, sem fins lucrativos e sem vínculos político-partidários, que dentre os objetivos nos destacamos na defensa dos direitos e interesses das comunidades religiosas de matriz africana, no dia 29 de outubro, encaminhamos conjuntamente com representativas entidades de direitos humanos nacionais e internacionais à ouvidoria da SEPPIR, a Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres, a Secretaria Especial de Direitos Humanos e para o Conselho Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça, cujo texto pode ser acessado através do link http://www.petitiononline.com/cen002/petition.html


Adicionalmente, articulamos junto ao Deputado Bira Côroa uma reunião com a Secretaria de Relações Institucionais do governo do Estado da Bahia (SERIN) e com o Secretário de Segurança Pública César Nunes.

Apoiamos publicamente e auxiliamos na construção de todas as deliberações do grupo em defesa da Iyalorixá Bernadete Souza, que são as abaixo discriminadas:


1. Exoneração do Secretário de Segurança Pública, Dr. Cesar Nunes;

2. Apuração imediata do todos os fatos ocorridos com a punição dos responsáveis;

3. Afastamento do Corregedor Adjunto da Polícia Militar do caso, por produção de relatório com vícios;

4. Criação de um grupo gestor propositivo para fazer parte das discussões e análises da segurança pública do Estado da Bahia;

5. Reformulação do Conselho Estadual de Segurança Pública;

6. Pedido formal de desculpas por parte do Governador Jacques Wagner;


No dia 10 de novembro, o governador Jaques Wagner recebeu a Ialorixá Bernardete, acompanhada lideranças religiosas como Egbomy Nice do Terreiro da Casa Branca, Babalorixá Pecê do Terreiro de Oxumarê, Iyá Jaciara Ribeiro do Terreiro Abassá de Ogum e lideranças do movimento negro e nesta, mais uma vez, reiteramos e reafirmamos nossos compromissos assumidos conjuntamente com as demais entidades do movimento negro e de religiosos.

Também ressaltamos que o caso foi abordado durante as atividades da 6ª Caminhada pela Vida e Liberdade Religiosa, como pode ser verificado através do endereço http://www.biracoroa.org/noticias_detalhe.asp?noticia_id=104, onde no dia 19 de novembro, na Sessão Especial referente ao dia da Consciência Negra na Assembléia Legislativa, a Iyá Bernadete foi convidada ao púlpito para denunciar o grave fato ocorrido e no 21 de novembro, durante entrevista concedida a Rede Bahia/TV Globo, denunciamos a ocorrência do fato de Ilhéus, como pode ser verificado através do endereço http://cenbrasil.blogspot.com/2010/11/vi-caminhada-pela-vida-e-liberdade_23.html .


Na sexta-feira, 26 de novembro, o deputado estadual Bira Corôa presidindo a Comissão Especial de Promoção da Igualdade da Assembleia Legislativa (CEPI) realizou Audiência Pública no Município de Ilhéus para discutir com órgãos do Governo do Estado, entidades, e sociedade civil, a Invasão ao Assentamento Dom Helder Câmara por policiais da 70ª CIPM (Companhia Independente da Polícia Militar de Ilhéus) culminado na agressão e tortura da Yalorixá Mãe Bernadete.

Durante o evento a Comissão de Mobilização representada pelo Coletivo de Entidades Negras (CEN), Movimento Negro Unificado (MNU), Coordenação Nacional de Entidades Negras (CONEN), Campanha Reaja, o Fórum Estadual de Juventude Negra e outros reivindicaram resposta ao documento encaminhado ao Governador Jaques Wagner.

Ao final da Sessão o deputado estadual Bira Corôa registrou alguns encaminhamentos como a aprovação de Audiência Pública na Câmara Federal na primeira quinzena de dezembro pelo deputado federal Luiz Alberto, também colocou a Comissão Especial de Promoção Igualdade (CEPI) como instrumento permanente de acompanhamento do caso e fez um apelo às instituições policiais para que estes saiam da audiência com a responsabilidade de zelarem pela vida dos envolvidos. Bira Corôa conclui afirmando que a sociedade deve mostrar o tamanho da sua indignação e sua insatisfação a ações e atos como o ocorrido no Assentamento Dom Helder Câmara.

Tomo o cuidado de relatar todo este processo para explicitar que na função de Coordenador-Geral do CEN e no contato que mantivemos com as diversas entidades citadas neste documento, em nenhum momento aconteceu qualquer choque de interesse por motivos espúrios e de subserviência devido a relações políticas partidárias ou por partidarismo.

Cabe ao CEN como sempre, a independência política, seriedade e compromisso que sempre tivemos com a causa e as nossas bandeiras de luta. Devido a isto, refutamos as notícias que foram postadas no site Afropress e que citam a mim, e ao CEN através das matérias: Advogados deixam caso em protesto à Operação Abafa e dirigente do MNU confirma Abafa, postadas respectivamente nos dias 23/11/2010 e 25/11/2010.

Em tempo, informamos que nutrimos por este veiculo de comunicação, o maior respeito e deferência por todo o serviço prestado a comunidade negra e a sociedade brasileira como um todo.

Marcos Rezende.
Coordenador-Geral do CEN

domingo, 28 de novembro de 2010

O papel do Coletivo de entidades Negras (CEN) no processo de Regularização Fundiária dos Terreiros de Salvador

A demolição do Oyá Onipó Neto em Salvador no dia 27 de fevereiro de 2008 deixou profundas marcas nas comunidades de terreiros de todo o Brasil. O fato em si causou muita comoção e também a unidade nacional entre religiosos de matrizes africanas.
O fato teve do Coletivo de Entidades Negras (CEN) uma atenção especial sendo que devido a gravidade dos fatos, fiz greve de fome durante quase uma semana em protesto à ação arbitrária ocasionada por prepostos da prefeitura de Salvador.
Ainda em meio à comoção geral e a Audiência Pública na Assembléia Legislativa solicitada pela Comissão especial de Promoção da Igualdade (CEPI), foi criada uma frente em defesa do Terreiro e algumas exigências foram postas. Sendo elas abaixo enumeradas:
1. Pedido de desculpas formal do Prefeito de Salvador e a garantia de que atos como aquele não mais aconteceria com qualquer outro templo religioso de Salvador de qualquer religião que fosse;

2. Reforma do Terreiro Oyá Onipó Neto e a garantia da permanência do mesmo no local;

3. Encaminhamento de um Projeto de Lei a Câmara de Vereadores que garantisse a Regularização fundiária de todos os terreiros de Salvador;

As duas primeiras exigências foram cumpridas quase que de maneira imediata, apesar da certeza de que o prejuízo religioso nunca foi e não será reparado, mas a referente à Regularização Fundiária dos Terreiros de Candomblé foi encaminhada para Câmara de Vereadores através de um Projeto de Lei para apreciação dos vereadores para alteração da Lei Orgânica do Município.

A proposta inicial de emenda a Lei Orgânica que foi enviada à Casa Legislativa pelo Poder Executivo desapareceu e após denúncias a mesma voltou à pauta. O projeto inicial previa originalmente a regularização fundiária apenas para os terrenos ocupados por terreiros de candomblé, mas os vereadores da bancada evangélica pressionaram para que o projeto fosse alterado, de modo a beneficiar também outras denominações religiosas, o que inicialmente gerou resistência por parte dos religiosos de matrizes africanas, haja visto que temos a especificidade de todo o tipo de perseguição religiosa na nossa história, mas como lutamos contra todo e qualquer tipo de intolerância religiosa, por fim acatamos a resolução, apesar de pontuarmos o princípio de reciprocidade.
Salientamos que o projeto de regularização fundiária dos terreiros foi concebido a partir da luta do CEN e de outras entidades do movimento social negro como forma de REPARAÇÂO aos estragos causados a todos os religiosos de matrizes africanas através da demolição do Oyá Onipo Neto e como forma de minimizar o impacto negativo produzido pela atitude intempestiva da ex-secretária municipal de Planejamento, Kátia Carmelo, que comandou a derrubada do templo da Boca do Rio, num ato de intolerância religiosa que repercutiu em todo o país.
O texto de nº 01/09 que altera o art. 14 da Lei Orgânica do Município estendeu os benefícios relacionados à regularização fundiária dos terreiros a outras religiões. Além disso, determina que os terreiros terão que se adequar ao que manda a Lei 7216/07 (que trata do Patrimônio Histórico e Cultural Africano e Afro-brasileiro) para ter acesso ao benefício gerando assim um efeito contrário aos religiosos de matrizes africanas, uma vez que nós, religiosos de matrizes africanas construímos todo este processo e ainda assim somos os únicos a ter que dar provas quanto a nossa pertença religiosa para sermos contemplados, garantia esta que nenhuma outra denominação necessitará dar.
Após muito trololó no dia 21 de dezembro de 2009 foi aprovado em primeira instância na Câmara Municipal o projeto de regularização fundiária dos templos religiosos ficando a votação em segundo turno para ser apreciada no início deste ano, fato este que não aconteceu. Sendo que somente agora, no dia 17 de novembro, próximo a data comemorativa do Dia da Consciência Negra (20 de novembro) é que foi votado em segundo turno e aprovado por unanimidade o Projeto de Regularização Fundiária dos Templos Religiosos.
Os benefícios desta Lei para os Terreiros de Candomblé esta no fato de um avanço significativo na luta do povo de santo.
A regularização fundiária concede o título de posse aos proprietários de todos os templos religiosos de Salvador que ainda não o possuem, estima-se, no que diz respeito aos terreiros de candomblé, um total aproximado de 480 templos, e conseqüentemente garante a isenção de impostos e finalmente a certeza de que atos de intolerância religiosa como o do Oyá Onipó Neto não mais acontecerão iniciando assim um novo momento na história de conquistas dos religiosos de matrizes africanas.
Nós, religiosos de matrizes africanas da cidade de Salvador e com o auxílio dos candomblecistas de todo o Brasil e de outros países do mundo marcamos mais uma vez o nosso nome nas lutas políticas da cidade e de quebra trouxemos benefícios para todas as demais religiões. Cabe agora perguntar a eles quais são as disposições para construir processos baseados em respeito à diversidade religiosa e de parceria na busca cotidiana de um mundo melhor, o que certamente é o desejo de toda e qualquer religião seguindo qualquer que seja o princípio fundamental da criação.

Marcos Rezende
Coordenador Geral do CEN
Ogan confirmado para Ewá do Ilê Axé Oxumarê e Historiador

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Assembléia sedia pré - lançamento do livro "Exército na segurança Pública", do Capitão Marinho.


SINOPSE
(...) Querer que os militares do Exército empreguem a força somente se necessário e de forma comedida, como devem ser as ações policiais em um Estado Democrático de Direito, é a mesma coisa de querer criar uma onça como um gatinho de estimação, é contrariar a natureza. Os militares do Exército são treinados para não ter compaixão, para beber o sangue do inimigo como se bebe um copo de água gelada em uma tarde quente de verão. Não se pode exigir de um combatente a postura de um gentleman, solicitando ao suspeito a gentileza de acompanhá-lo até a delegacia (...)

“O livro do Capitão Marinho, além da instigante leitura, haverá de interessar a militares, policiais, executivos da segurança pública, pesquisadores, políticos e a todos aqueles que se preocupam com o tema da segurança, em seus múltiplos aspectos.”
Jorge da Silva - Ex-Secretário de Direitos Humanos do Estado do Rio de Janeiro


CURRÍCULO DO AUTOR
Capitão Marinho estudou toda sua vida escolar no Colégio da Polícia Militar do Estado da Bahia; cursou a Escola Preparatória de Cadetes do Exército (EsPCEx); graduado em Ciências Militares pela Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN) e Pós-graduado pela Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais do Exército (EsAO); Bacharel em Direito; Pós-graduado em Direito Penal e Processo Penal pela Unesa; Pós-graduado em Psicologia Jurídica pela UCAM; Gestor em Segurança Pública e Justiça Criminal pela Universidade Federal Fluminense; Mestre em Direito pela Ucam; Diretor de Direitos Humanos e Segurança Pública do Instituto Pedra de Raio – Justiça Cidadã; é Capitão do Exército brasileiro.


SUMÁRIO DA OBRA
INTRODUÇÃO
Capítulo 1 - O EXÉRCITO E AS LEGISLAÇÕES PARA O SEU EMPREGO NA SEGURANÇA PÚBLICA
  1 As Forças Armadas no contexto do Estado Brasileiro
  2 Ministério da Defesa
  2.1 Histórico
  2.2 Estrutura organizacional
  3 Exército
  4 Histórico da missão constitucional das Forças Armadas "garantia da Lei e da Ordem" e sua re lação com a Polícia Militar
  5 Constituição da República Federativa do Brasil
  6 Lei Complementar 97, de 09.06.1999
  7 Decreto 3.897, de 24.08.2001
  8 Código de Processo Penal Militar

Capítulo 2 - O EXERCÍCIO DO MANDADO POLICIAL POR ORGANIZAÇÕES DE FORÇA
  1 Teoria de polícia
  2 Teoria da guerra e política de defesa
  2.1 Princípios de guerra
  Princípio do Objetivo
  Princípio da Ofensiva
  Princípio da Manobra
  Princípio da Massa
  Princípio da Economia de Forças
  Princípio da Unidade de Comando
  Princípio da Segurança
  Princípio da Surpresa
  Princípio da Simplicidade
  2.2 Política de Defesa Nacional
  2.3 Doutrina militar de defesa
  3 Perspectiva combatente para a guerra
  4 Polícia no Brasil: uma força combatente na Segurança Pública

Capítulo 3 - "OPERAÇÃO BAHIA" E "OPERAÇÃO ABAFA": ANÁLISE DE CASOS
  1 Operação Bahia
  2 Operação Abafa

CONCLUSÃO

REFERÊNCIAS
              

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Terreiros de candomblé da BA pedem que filhos-de-santo se declarem ao Censo 2010

A pouco mais de dois meses para o encerramento do Censo 2010, os terreiros de candomblé e umbanda da Bahia intensificaram uma campanha para que seus filhos-de-santo declarem aos pesquisadores serem adeptos dos cultos.

Segundo dados do último censo geral do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), realizado em 2000, apenas 0,49% da população de Salvador (aproximadamente 9.000 pessoas, à época) declarou pertencer a uma religião de matriz africana. Esse número é, proporcionalmente, bem menor que em capitais como Porto Alegre (2,5%) e Rio de Janeiro (1,2%).

“Levando-se em consideração que Salvador é considerada a cidade com o maior contingente negro fora da África, os dados confirmam que o sincretismo religioso no Estado acabou favorecendo, historicamente, religiões majoritárias, como a católica”, observou Joílson Rodrigues, coordenador de informação do IBGE na Bahia.

A campanha que pretende desvendar o real número de adeptos do candomblé e da umbanda na Bahia é feita pela internet, principalmente pelas redes sociais, além de mensagens por telefone, mala direta, contatos pessoais e distribuição de panfletos.

“Faço questão de conversar pessoalmente com meus filhos-de-santo, pedindo que eles não tenham vergonha da nossa indumentária, das nossas músicas, das nossas danças, ao contrário, que sintam orgulho de nossa cultura. Além disso, estou usando a internet e outros meios digitais para divulgar a campanha fora da Bahia”, afirmou o babalorixá Sivanilton Encarnação da Mata, mais conhecido como Babá Pecê de Oxumarê. Líder do terreiro Ilê Axé Oxumarê, fundado no século 19 e um dos mais tradicionais do Brasil, o babalorixá é o coordenador da campanha na Bahia.

No ano passado, o Coletivo de Entidades Negras (CEN) lançou a campanha “Quem é de axé diz que é” para estimular os filhos e filhas-de-santo a divulgarem que são adeptos dessas religiões. Com o início do Censo 2010, os terreiros da Bahia resolveram ampliar a iniciativa. O movimento popular conta com o apoio da Federal Nacional do Culto Afro-Brasileiro e outras associações ligadas à causa da intolerância religiosa.

“Queremos conscientizar o povo-de-santo sobre a importância de assumir a sua identidade religiosa com orgulho e, assim, chamar atenção da sociedade para a necessidade de criação de políticas públicas para nós, adeptos de religiões afro-brasileiras”, disse Marcos Rezende, coordenador-geral do CEN.

Um levantamento feito entre 2006 e 2007, pelas Secretarias Municipais de Reparação (Semur) e da Habitação (SMH), em parceria com o Ceao (Centro de Estudos Afro-Orientais, órgão da Universidade Federal da Bahia), revelou que existem 1.165 terreiros na capital baiana. Contudo, de acordo com estimativas do antropólogo Jocélio Teles, diretor do Ceao e coordenador da pesquisa, esse número é ainda maior. Na Bahia, a Federação do Culto Afro estima a existência de cerca de 4.000 terreiros.

“A campanha dos terreiros é importante porque, depois do Censo, teremos informações mais precisas para caracterizar o povo brasileiro”, acrescentou Joílson Rodrigues.

Fonte: UOL

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Voto em Alaíde do Feijão até para Presidente do Brasil!

Cá estamos nós em momentos de eleições, e claro que estamos todos, de uma forma ou de outra, envolvidos no processo político eleitoral do nosso país.
É justamente também neste momento que a Fundação Palmares teve a brilhante idéia de reparar e democratizar as indicações ao Troféu Palmares. Primeiro indicando somente mulheres, e, diga-se de passagem, cada uma mais poderosa que a outra, e depois abrindo ao público a votação, possibilitando assim que possamos exercitar a nossa cidadania um pouco antes do pleito eleitoral nacional.
São três as categorias do Troféu Palmares: religiosa, cultural e social. Sendo que todas as indicadas são de fazer cair o queixo. Mas, quero exclusivamente me dedicar ao Campo Social.
Na verdade quero fazer uma homenagem, ser cabo eleitoral e pedir votos para Alaíde do Feijão.
Sem nenhum demérito às demais, mas pelo que ela representa para mim. E como tomo partido em vários processos, não poderia me furtar neste caso.
Alaíde do Feijão representa aquela mulher de tempos antigos, a tia da comunidade, dos bairros periféricos. Aquela tia que quando a nossa mãe saia para trabalhar ela lá estava a observar os filhos e perguntar o que ele estava fazendo na rua até tal hora da noite e dar bons conselhos. Sempre alerta, cuidou da juventude negra em épocas que o Estado Brasileiro não reconhecia o que era ser negro.
Esta querida mulher sempre sabia como ser dura e doce, enérgica e amável. Carregada de conhecimento tradicional, e forjada na Faculdade da Vida, do Gueto, do Mundo. Alaíde vendeu muito feijão para sobreviver e para garantir ate hoje a sobrevivência de muitos. Mas não falo de um feijão qualquer, a delícia de saborear o Feijão de Alaíde, não é tão somente pelo sabor, mas pela dignidade, pela batalha, pelos temperos espirituais e sentimentais invisíveis, mas atávico à nossa tradição. Pelo bate papo gostoso e aprendizado passado a cada garfada.
Na verdade o sue feijão não alimenta o nosso corpo, mas a nossa alma e a cada dedo de prosa, temos a mais completa certeza de que apesar de tudo, vale a pena viver e pedir a benção a cada momento que Alaíde dá um conselho.
Alaíde é uma ilustre filha da Ilha de Itaparica e conhece o Movimento Negro Baiano mais do que qualquer tese de doutor da academia formal. Ela lê nas entrelinhas, e mais do que isto, posso afirmar, que todo militante negro baiano ao passar por momentos de dificuldade nas suas batalhas diárias foi lá naquele cantinho aconchegante do Pelourinho onde está instalado o Feijão da Alaide, se reconfortar em uma mesinha onde Alaide fica sentada como a esperar para dar consultas com um cuidado e responsabilidade ancestral. Lá diariamente está sentada Alaíde do Feijão, e na sua panela do saber está a receita dos conselhos de mestra, de mãe, de tia de comunidade, de egbomy do Axé.
Alaíde é minha mestra, e este texto pode não garantir um único voto, pode até não ser lido, ou ser tratado de forma descartável frente a minha mediocridade. Mas tem um significado muito especial para mim. Significa dizer para o mundo que Alaíde é minha mãe. A Mãe Preta que cuida, que zela, que passa a mão no telefone para saber como eu estou, por que sumi, o que estou fazendo, para me confortar. Para, através destes gestos me mostrar que a vida é dura, mas que ela ainda é capaz, e muitíssimo capaz de amar e me ensinar a amar e manter a chama viva. E que no final de cada batalha posso ir lá e ela estará pronta e a postos para cuidar das minhas feridas e fazer cicatrizar as dores da alma. Não em postura passiva, mas na sabedoria de quem me mandou para a o campo de batalha, e eu sei muito bem quem comanda a frente.
Este texto é tão somente para dizer e declarar ao mundo a minha querência por Alaíde do Feijão, e principalmente agradecer por tudo!
Alaíde, eu voto em ti com toda a certeza para 3 coisas: ser premiada pela Fundação Cultural Palmares, ser Presidente do Brasil e com mais certeza ainda para ocupar a cadeira do Conselho de Segurança da ONU, pois já te vejo lá, sentada naquele cantinho, dando bons conselhos para o mundo se manter em paz, e quando perguntarem a você como está a sua vida, sei que irá desconversar, como a querer dizer a vida é dura, mas é a que se tem e a que devemos amar e tocar como uma grande orquestra afro. A nos mostrar que a sua passagem por aqui é para se doar, e doar, doar, doar. Ensinando-nos sempre que o amor não tem limites e que apesar de cada não, de cada dor que nos invade somos nós a alegria da cidade.
Alaíde, simplesmente te amo e obrigado por me transformar em alguém melhor para o mundo e mundo muito melhor para mim e muitos outros que podem ate não te conhecer, mas que desfrutam da sua boa energia.

Marcos Rezende.
Ogã de Ewá do Ilê Axé Oxumarê
Coordenador Geral do CEN

sábado, 7 de agosto de 2010

Arcebispo e as ovelhas negras

Em A TARDE do dia 2 de agosto vi a notícia da queda do comando da Polícia Militar. Como ativista da questão racial,procurei saber se houve alguma manifestação da campanha “Reaja ou será morto”, do MNU, CEN, Atitude Quilombola, Unegro, Círculo Palmarino, ou se ocorreu uma nova chacina que ceifa a vida de jovens negros todos os dias.

Mas o maior susto veio ao ler que no dia anterior,a pedido do cardeal arcebispo de Salvador, Dom Geraldo Majella, aconteceu o ato de “Um dia pela paz”. Ou seja, por mais que as famílias do Bairro da Paz tivessem parado a Paralela, que a comunidade do Pelaporco tivesse queimado um ônibus, que no monumento a Mãe Runhó, no Engenho Velho,tivessem colocado uma faixa pedindo paz, e que veículos de comunicação importantes como a Carta Capital e a Al-Jazeera transformassem estas denúncias em notícias,bastou a Igreja Católica se mostrar incomodada para acontecer mudanças na cúpula da Polícia Militar (PM).

Interessante é que na semana passada em um evento do Nafro/PM (Núcleo de Religiões de Matriz Africana da Polícia Militar do Estado da Bahia) a PM foi homenageada juntamente com algumas outras instituições. Eu fui uma das pessoas que receberam a premiação e,para espanto de todos,fugi ao script,pedindo a palavra.

Falei do extermínio da juventude negra e da importância de fazer uma força-tarefa para conter as mortes. O então comandante-geral da PM,coronel Santana,confraternizou- se comigo e garantiu somar esforços para cuidar da questão. Não deu tempo. O comandante caiu,mas o genocídio continua.

Fica a lição de que não é arrancando fardas de policiais que também são vítimas de um sistema capitalista patrimonialista e mudando o comando da PM que resolveremos a questão da violência. Tampouco instalando câmeras do Programa Big Brother Bairro, conforme propôs um candidato no debate para prefeito. Necessário é ter coragem de transformar a política de segurança pública em uma política em defesa da vida, dos direitos humanos e voltada à comunidade periférica, assim como garantir a melhoria da qualidade de vida para os policiais,que por serem negros são tratados como tal.

Enfim, quando vejo a foto de um candidato a prefeito evangélico fugindo de um terreiro de candomblé tal qual o diabo foge da cruz, a lembrança do Nafro homenageando o coronel Santana e pedindo para os orixás o protegerem uma semana antes de ele perder o cargo,e o arcebispo pedindo mudanças pela paz e sendo ouvido pelo homem branco dos olhos azuis que não está pregado na cruz, fico a perguntar: não seria melhor nós, as ovelhas negras, conversarmos com o bispo e o transformarmos em nosso representante para evitar que se derrame o sangue negro desta cidade? Assim, quem sabe, nós, negros, poderíamos ser ouvidos e respeitados.


Marcos Rezende.

Publicado em 07/08/2008 (1º Caderno)
Jornal A Tarde / Salvador, Bahia


quarta-feira, 30 de junho de 2010

Movimentos sociais protestam e ocupam Brasília

Militantes de diversos movimentos sociais pretendem ocupar a capital brasileira, hoje (dia 30/06), para exigir do presidente Lula o veto ao Estatuto da Igualdade Racial. Fruto de luta das organizações vinculadas à causa negra, o Estatuto chega para sanção presidencial com o conteúdo esvaziado, frustrando expectativas e provocando forte reação de lideranças históricas, que consideram o texto resultante do acordo um grave retrocesso no combate à discriminação racial.
O Estatuto da Igualdade Racial entrou no Senado Federal com propostas estruturantes, como a criação do Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial, e dispositivos concretos, como o sistema de cotas. No processo de negociação com lideranças político-partidárias, porém, muitas das ações afirmativas foram retiradas, provocando uma onda de protestos pelo País e desencadeando a mobilização nacional contra a última versão da lei.
TEXTO “PÁLIDO” – Além de não contemplar algumas das reivindicações mais importantes dos movimentos sociais vinculados à causa negra, o texto negociado também empalidece o aspecto político, ao suprimir trechos que, para o coordenador geral do Coletivo de Entidades Negras (CEN) e membro do Conselho Nacional de Segurança Pública (Conasp), Marcos Rezende, apontavam para o reconhecimento do racismo – passo decisivo para seu devido enfrentamento.
“O fato de não existir raça não anula a crença em sua existência. Foi a crença na superioridade de uma etnia sobre outra que legitimou atrocidades contra os negros, ao longo dos séculos. E essa crença chama-se racismo. Negá-la é tentar apagar o que não se pode apagar, principalmente porque não é coisa do passado. O racismo é uma herança viva, que continua a promover o genocídio contra o nosso povo”, pontua o líder comunitário.
É principalmente por temer o futuro da luta contra o racismo que as lideranças das organizações do Movimento Negro querem interditar a versão da lei que está para ser sancionada. No entendimento do ex-senador Abdias do Nascimento, ícone do combate à discriminação racial no Brasil, o Estatuto, ao contrário do que alguns acreditam, não servirá de base para a continuidade do processo. Pelo contrário. Irá dificultá-lo, constituindo-se mesmo em “disfarce” para a manutenção desse tipo de opressão.
Reação idêntica teve Reginaldo Bispo, coordenador nacional do Movimento Negro Unificado (MNU), para quem “a aprovação do malfadado Estatuto, por si só, é um retrocesso em relação aos avanços do nosso povo nos últimos quarenta anos”, pontuando que o texto foi pouco e mal discutido pelas organizações do Movimento Negro brasileiro. “A maioria das pessoas negras, em especial a militância, não conhece nenhum dos textos, que foram vários, que circularam até agora”, alerta.
O coordenador nacional do MNU explica que o projeto do acordo feito no Senado Federal tem origem no texto aprovado na Câmara dos Deputados em novembro de 2009, o qual já havia sido bastante modificado. “Foram quatro ou cinco alterações, e quando o texto foi para a Comissão de Constituição e Justiça do Senado, tornou a ser modificado pelo relator, que é o presidente da comissão, ou seja, o senador ruralista, de direita, do DEM, Demóstenes Torres”.
O “corte-recorte”, segundo Bispo, desfigurou o Estatuto, suprimindo pontos considerados cruciais, como as cotas para negros nas universidades, nos partidos e no serviço públicos, e a defesa e o direito à liberdade de prática das religiões de matriz africana. Ele denuncia, ainda, a ausência de posicionamento sobre a proteção da juventude negra, “que sofre verdadeiro genocídio por parte das polícias militares”, e a não caracterização do escravismo e do racismo como crimes de lesa-humanidade.

CONVOCATÓRIA – Na convocatória para o ato em Brasília, as lideranças denunciam, em uníssono a ameaça aos “direitos étnicos constituídos nos acordos internacionais de combate ao racismo e todas as formas de discriminação, xenofobia e intolerâncias correlatas”, e alertam que, caso sancionado, o Estatuto significará “a repetição do acordo oferecido pelo Estado brasileiro a Ganga Zumba [...], que propunha a trégua e a paz em nome da destruição do Quilombo de Palmares”.
E entre os direitos duplamente ameaçados estão os dos quilombolas, cuja garantia de titulação de terras foi retirada do Estatuto, estando em vias de ser atingida também pela “Ação Direta de Inconstitucionalidade”, impetrada pelo DEM, por influência da União Democrática Ruralista (UDR). Trata-se da ADI 3239, que visa modificar o decreto 4887/2003, referente à regularização dos territórios dos descendentes de escravos negros refugiados, e encontra-se no Supremo Tribunal Federal (STF), para aprovação.
O coordenador da Frente Nacional em Defesa dos Territórios Quilombolas, Damião Braga, explica que este processo não está descolado do posicionamento pelo veto de Lula ao Estatuto, “pois todos os processos constituídos como foco de nossa resistência foram impetrados pelo DEM. O que estamos questionando é se o Governo Lula estará de acordo com as imposições do poder dos escravocratas e ruralistas a serviço do agronegócio em nosso País”.
Foi também o DEM que ajuizou a “Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental” (ADPF) de número 186, que investe contra as cotas para negros nas universidades públicas – igualmente riscadas do texto. “Querem negar que a cor da pele condiciona o acesso a determinadas posições, ignorando dados como os do IBGE, que demonstra que universitários negros em Salvador, por exemplo, não conseguem remuneração equivalente à dos brancos com a mesma formação”, argumenta Rezende.
“Temos o entendimento de que todos os direitos que o DEM tenta desesperadamente nos retirar são aqueles que efetivamente darão poder ao povo negro, ou seja, terras, cotas e direito indenizatório”, analisa o combativo Damião Braga, que é também vice-presidente da Associação Quilombola do Estado do Rio de Janeiro (AQUILERJ) e membro da Coordenação Nacional de Articulação de Comunidades Quilombolas (CONAQ).


JUSTIÇA – Os militantes ressaltam os avanços alcançados durante o governo Lula, com a efetivação de políticas “importantes de emancipação e justiça social, como o Programa Luz para Todos”, que chegou às comunidades quilombolas, e os programas habitacionais, “que estão chegando ao campo e à cidade e, sobretudo, na cidade, atendendo à população negra”. Mas querem que o chefe do Poder Executivo do Brasil se posicione em relação ao que consideram um “retrocesso” no âmbito de tais políticas.
Para tanto, estão solicitando uma audiência com o presidente da República, já tendo sido reservado o auditório Nereu Ramos (anexo da Câmara dos Deputados, em Brasília). A articulação pela retirada de pauta do Estatuto no Senado Federal já mobilizou mais de duzentas organizações do movimento social brasileiro, e a expectativa é de que pelo menos quatrocentas pessoas participem do ato no Distrito Federal, estando confirmada a presença de militantes dos movimentos Sindical, dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) e pela Reforma Urbana (MNRU).


COORDENAÇÃO – A ação articulada e contundente de defesa dos interesses das populações marginalizadas é iniciativa da Assembléia Negra e Popular e da Frente Nacional em Defesa dos Territórios Quilombolas, sob coordenação do Movimento Negro Unificado (MNU), do Coletivo de Entidades Negras (CEN), do Círculo Palmarino, do Fórum Nacional de Juventude Negra (FOJUNE) e da Coordenação Nacional de Articulação de Comunidades Quilombolas (CONAQ).
E confronta posições como as da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), responsável pelo acordo, e da Central Única dos Trabalhadores (CUT), que o apóia. Na convocatória, as lideranças resgatam trecho de um dos discursos de Carlos Spis, da CUT (“...queremos consolidar as mudanças dos últimos anos, ampliar as conquistas, avançar nas mudanças que ainda faltam e impedir qualquer retrocesso”), para questionar: “Essa fala referenda a luta negra também?”.


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SERVIÇO
O QUÊ: Mobilização pelo veto de Lula ao Estatuto aprovado no Senado e pelo indeferimento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) número 3239, do DEM, contra o decreto 4887, do Supremo Tribunal Federal (STF), que regulariza os territórios quilombolas.
QUANDO: Dia 30/06/10, às 14 horas.
ONDE: Auditório Nereu Ramos, localizado no Anexo II da Câmara dos Deputados, Brasília (DF).
CONCENTRAÇÃO ÀS 10 HORAS, EM FRENTE AO PRÉDIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.


_________________________
CONTATOS
Marcos Rezende
marcosrezende100@gmail.com
(71) 8835-4792
(71) 9267-6383
Consuelo Gonçalves
consu2009@hotmail.it
(71) 3334-6170
(71) 9962-0313


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A voz de algumas das mais expressivas lideranças do País
A aprovação do malfadado Estatuto, por si só, é um retrocesso em relação aos avanços do nosso povo nos últimos quarenta anos” (Reginaldo Bispo, coordenador nacional do MNU).
[...] todos os direitos que o DEM tenta desesperadamente nos retirar são aqueles que efetivamente darão poder ao povo negro” (Damião Braga, coordenador da Frente Nacional em Defesa dos Territórios Quilombolas).
É a continuidade do racismo [...]. Essas leis, esses disfarces para não chamar o Brasil de racista continuam” (Abdias do Nascimento, um dos ícones do movimento negro brasileiro).
Da forma que está dificulta a nossa luta. Eles vão jogar na nossa cara que já temos um Estatuto” (Reginaldo Bispo, coordenador nacional do MNU).
[...] Vejo como um Estatuto desidratado” (Damião Feliciano, deputado federal, PDT-PB).
As cotas nas universidades seriam o mínimo...” (Antônio Cortês, advogado dos direitos do negro).
Foi como se apunhalasse pelas costas toda a luta do movimento negro” (Letícia Lemos da Silva coordenadora-adjunta da Maria Mulher - Organização de Mulheres Negras).
O fato de não existir raça não anula a crença em sua existência [...] e essa crença chama-se racismo” (Marcos Rezende, coordenador geral do Coletivo de Entidades Negras).


Fonte: http://www.acaoilheus.org/news/2237-movimentos-sociais-protestam-e-ocupam-brasilia

quinta-feira, 4 de março de 2010

Prefeito descarta se retratar por terreiro demolido

O prefeito João Henrique recusou-se ontem a fazer qualquer retratação pública sobre a demolição do terreiro Oyá Unipó Neto, realizada por agentes da Superintendência de Manutenção, Conservação e Uso do Solo (Sucom). Desde a noite de sexta-feira, o coordenador geral do Coletivo de Entidades Negras, Marcos Rezende, diz estar em greve de fome para obrigá-lo a pedir desculpas aos adeptos do candomblé. A reconstrução da casa de candomblé, no Imbuí, garantida pela prefeitura, ainda não tem data para iniciar.

“Da parte da prefeitura nós fizemos tudo o que foi possível. Nós já reparamos os excessos cometidos pelo fiscal da Sucom que cumpriu a ordem de demolição. Não vejo necessidade de fazermos uma retratação”, declarou à tarde João Henrique, que é evangélico. Ele falou sobre o assunto após cerimônia de posses do secretário de Educação, Carlos Soares, e do novo superintendente da Sucom, Cláudio Silva, e do presidente do IPS, Ricarte Passos, no Palácio Thomé de Souza.

O prefeito, através do secretário de Comunicação, André Curvello, já havia dito que nenhum outro templo de religioso seria demolido na cidade. Exonerada da Sucom, mas ainda à frente da Secretaria de Planejamento, a qual a Sucom é subordinada, Kátia Carmelo engrossou o coro contrário a um pedido de desculpas do chefe do executivo municipal. “A decisão do órgão foi respaldada pelos processos fiscais do órgão”.

Não é esta a opinião de Rezende e outros representantes de entidades ligadas ao culto afro, a exemplo da Associação Brasileira de Preservação da Cultura Afro-Ameríndia (AFA). “Não adianta apenas prometer a ressarcir o prejuízo material. João Henrique tem que se dar conta da gravidade do erro da prefeitura e se retratar pessoalmente, e não através de intermediários”, disse Resende.

Ele dorme no Unipó Neto desde a sexta-feira à noite, quando diz ter iniciado o jejum. No período diz ter ingerido apenas água, soro, e acaçá - pequeno alimento feito a partir do milho, considerado adeptos do candomblé. “Tem a mesma importância do que a hóstia para os católicos”.

Filho de Xangô, Marcos Rezende freqüenta o terreiro Ilê Axé Oxumarê, no Engenho Velho da Federação. Antes de ser levado para depôr no Ministério Público Estadual (MPE), que apura o caso, ele foi medicado por uma equipe do Serviço Móvel de Atendimento de Urgência (Samu), no início da tarde. “É preciso que a prefeitura inclua o Unipó Neto no programa de regularização fundiária, para evitar que depois de erguido, o terreiro venha a ser destruído novamente”.


Notícias originalmente publicado em 4 de março de 2008 | Correio da Bahia


sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

Começando pelo início...

Ó Exu
ao bruxoleio das velas
vejo-te comer a própria mãe
vertendo o sangue negro
que a teu sangue branco 
enegrece
ao sangue vermelho
aquece
nas veias humanas
no corrimento menstrual
à encruzilhada dos
teus três sangues
deposito este ebó
preparado para ti


Tu me ofereces?
não recuso provar do teu mel
cheirando meia-noite de 
marafo forte
sangue branco espumante 
das delgadas palmeiras
bebo em teu alguidar de prata
onde ainda frescos bóiam
o sêmen a saliva a seiva
sobre o negro sangue que circula
no âmago do ferro
e explode em ilu azul


Ó Exu-Yangui
príncipe do universo e 
último a nascer
receba estas aves e 
os bichos de patas que
trouxe para satisfazer 
tua voracidade ritual
fume destes charutos
vindos da africana Bahia
esta flauta de Pixinguinha
é para que possas chorar
chorinhos aos nossos ancestrais
espero que estas oferendas 
agradem teu coração e 
alegrem teu paladar
um coração alegre é
um estômago satisfeito e
no contentamento de ambos
está a melhor predisposição 
para o cumprimento das 
leis da retribuição
asseguradoras da
harmonia cósmica


Invocando estas leis 
imploro-te Exu
plantares na minha boca
o teu axé verbal
restituindo-me a língua
que era minha 
e ma roubaram
sopre Exu teu hálito
no fundo da minha garganta
lá onde brota o 
botão da voz para
que o botão desabroche
se abrindo na flor do
meu falar antigo
por tua força devolvido
monta-me no axé das palavras
prenhas do teu fundamento dinâmico
e cavalgarei o infinito
sobrenatural do orum
percorrerei as distâncias
do nosso aiyê feito de
terra incerta e perigosa


Fecha o meu corpo aos perigos
transporta-me nas asas da 
tua mobilidade expansiva
cresça-me à tua linhagem
de ironia preventiva
à minha indomável paixão
amadureça-me à tua 
desabusada linguagem
escandalizemos os puritanos
desmascaremos os hipócritas
filhos da puta
assim à catarse das 
impurezas culturais
exorcizaremos a domesticação
do gesto e outras
impostas a nosso povo negro


Teu punho sou
Exu-Pelintra
quando desdenhando a polícia
defendes os indefesos
vítimas dos crimes do
esquadrão da morte 
punhal traiçoeiro da 
mão branca
somos assassinados
porque nos julgam órfãos
desrespeitam nossa humanidade
ignorando que somos 
os homens negros
as mulheres negras
orgulhosos filhos e filhas do
Senhor do Orum
Olorum
Pai nosso e teu
Exu 
de quem és o fruto alado
da comunicação e da mensagem


Ó Exu
uno e onipresente
em todos nós
na tua carne retalhada
espalhada por este mundo e o outro
faça chegar ao Pai a
notícia da nossa devoção
o retrato de nossas mãos calosas
vazias da justa retribuição
transbordantes de lágrimas
diga ao Pai que nunca
no trabalho descansamos
esse contínuo fazer 
de proibido lazer
encheu o cofre dos exploradores
à mais valia do nosso suor
recebemos nossa
menos valia humana
na sociedade deles
nossos estômagos roncam de
fome e revolta nas cozinhas alheias
nas prisões
nos prostíbulos
exiba ao Pai
nossos corações
feridos de angústia
nossas costas chicoteadas
ontem
no pelourinho da escravidão
hoje 
no pelourinho da discriminação


Exu 
tu que és o senhor dos 
caminhos da libertação do teu povo
sabes daqueles que empunharam
teus ferros em brasa
contra a injustiça e a opressão
Zumbi Luiza Mahin Luiz Gama
Cosme Isidoro João Cândido
sabes que em cada coração de negro
há um quilombo pulsando
em cada barraco
outro palmares crepita
os fogos de Xangô iluminando nossa luta
atual e passada


Ofereço-te Exu
o ebó das minhas palavras
neste padê que te consagra
não eu
porém os meus e teus
irmãos e irmãs em
Olorum
nosso Pai
que está 
no Orum



Laroiê!


Búfalo, 2 de fevereiro de 1981


PADÊ DE EXU LIBERTADOR
Abdias Nascimento


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